Ainda assim, com toda a realidade a berrar-lhe nos ouvidos que ela não tinha a menor chance, enamorou-se dele. Amor de um lado só. Seu temperamento irritado e inconstante deu lugar a uma calorosidade (se é que essa palavra existe) que derreteria até as calotas polares e uma receptividade tão grande que nem o Grande Gatsby a barraria como anfitriã. E, era assim, abrindo os salões de baile de seu coração que ela aguardava os sinais da presença de seu menino.
Uma carta, um bilhete, um e-mail, um almoço, um happy hour, uma palavra...Ia alimentando-se de esperança...Ia fazendo fotossíntese com a luz do amor imaginário que ela inventara para fugir da realidade. Certa feita, em uma conversa informal que os dois divertidamente mantinham antes de adentrarem em um bar, ele disse que havia sonhado com ela, e que seus familiares ouviram chamar-lhe pelo seu nome. Neste dia, a razão fora passear enquanto o coração tentava arrumar a casa. Sentaram-se em um bar nas proximidades da loja de discos em que trabalhavam, e enquanto ele falava, ela o observava com uma vontade barbara de beija-lo...Seus cílios compridos, a risada fácil, a inteligencia previlegiada, a empatia compartihada em idéias e na presença reconfortante que sempre a enternecia.
Enquanto ele ia ao toalete, a razão retornara se seu passeio, e foi colocar o coração no seu devido lugar. Quando ele retornou, havia uma notinha escrita em um guardanapo dizendodizendo :
"Querido,
Me sinto ridícula em te dizer, mas adoro-te.
Penso em esses seus olhinhos quase o tempo inteiro e, quando não sei de ti, abre-se uma lacuna em minha vida. Mas, acredito que esta ficará sem o preenchimento da palavra necessária para dar sentido a frase, por muito tempo...
Pelos gostos que tens e as mulheres que possuistes, dentre todas seria a última opção. Primeiro, pela idade, segundo pela forma, e terceiro jamais burlaria as regras de tua vaidade.
Peço que em perdoe, mas sendo tu o que és, já me cativaste. E sendo assim, preciso te esquecer antes que isso vire uma norme balburdia em minha mente.
Pediu demissão da loja, pegou sua mochila e foi viajar.
Precisava completar a lacuna com uma palavra que o amor não lhe dava, aliás nunca lhe dera.
O amor a aprisionava, então estava disposta a substituir por uma palavra diferente : Liberdade. No momento, além do seu vício se sonhar seria a que faria mais sentido do que àquela que sempre a governara : platônica.